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Política Kits de robótica

Governo Bolsonaro destina R$ 26 mi em kit robótica para escolas sem água e computador

Verba do MEC beneficia empresa de aliado de Lira em AL; pasta não comenta, e presidente da Câmara nega envolvimento

11/04/2022 às 14h26
Por: Redação Fonte: Mega Cidade com Folha de São Paulo
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governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) destinou R$ 26 milhões de recursos do MEC (Ministério da Educação) para a compra de kits de robótica para escolas de pequenas cidades de Alagoas que sofrem com uma série de deficiências de infraestrutura básica, como falta de salas de aula, de computadores, de internet e até de água encanada.

Todos os municípios têm contratos com uma mesma empresa de aliados do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), responsável por controlar em Brasília a distribuição de parte das bilionárias emendas de relator do Orçamento, fonte dos recursos dos kits de robótica.

Cada kit foi adquirido pelas prefeituras por R$ 14 mil, valor muito superior ao praticado no mercado e ao de produtos de ponta de nível internacional.

A reportagem visitou nos últimos dias seis das sete cidades beneficiadas e conversou com professores, gestores municipais e moradores.

Canapi (AL) recebeu R$ 5,4 milhões para a compra de 330 kits, o equivalente a R$ 706,63 por aluno matriculado. A cidade tem 35 escolas e grandes desafios educacionais —nenhuma tem laboratório de ciências, por exemplo, e mais da metade não conta com internet.

Na escola rural Almirante Benjamim Sodré, no povoado de Cova do Casado, o pátio é de chão batido, alunos de séries diferentes precisam estudar na mesma sala e falta água encanada.

 

É preciso usar um balde para dar a descarga dos banheiros usados pelos alunos da educação infantil e anos iniciais do fundamental. A escola, com paredes descascadas, ainda aguarda por reforma.

A coordenadora da escola, Rosiane Maria Silva da Paz, 29, contou que o anúncio do projeto de robótica empolgou os professores, por se tratar de uma novidade. Mas há muitas outras prioridades.

"Sobre a questão da água, ter na torneira facilitaria mais, além de ter mais salas e manter a internet. A pintura também seria importante, estou com fé em Deus que sairá a reforma", diz ela, que estudou na mesma escola.

"Ainda precisa reformar o pátio porque é de terra e a gente não deixa os meninos correrem no terreno, que tem muita pedra."

Na cidade de Santana do Mundaú, os R$ 4,5 milhões recebidos pelo FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) para a compra de robôs equivale a um gasto de R$ 1.473 por aluno.

Na escola Pequeno Príncipe, no bairro Jussara de Santana do Mundaú, os robôs já são esperados pelos educadores com certo entusiasmo, apesar de receio pela falta de algumas condições: os alunos não têm acesso a computadores, essencial para o uso dos robôs.

"Nosso problema hoje é a questão da internet. Quando esse recurso vier, precisa de toda uma organização para que esse projeto funcione", diz Larissa Ferreira, 33, uma das coordenadoras da escola de 558 alunos.

Governo Bolsonaro destina kit de robótica para escolas sem água nem computador

As cidades beneficiadas têm entre 2.749 e 11.954 matrículas. Todos os sete municípios contam com deficiências educacionais mais urgentes do que a adoção de projetos de robótica, conforme constatado pela reportagem.

Enquanto a Prefeitura de União dos Palmares recebeu R$ 7,5 milhões para a compra de kits de robótica, há três obras com recursos federais paradas na cidade. No bairro Condomínio Newton Gonçalves, o prédio que seria uma creche está apenas como um esqueleto de paredes sem telhados.

A construção, orçada em R$ 3,4 milhões, foi liberada em 2014 e, hoje, permanece paralisada com 71% de execução. A dona de casa Dayane Rodrigues, 23, mora em frente.

"Eu ia botar minha filha mais velha na creche, mas nunca ficou pronta. Ela já está com 7 anos e a minha mais nova, de 2 anos, acho que também não vou conseguir matricular", disse.

Em Flexeiras, há uma obra abandonada de uma creche na mesma rua da Secretaria de Educação, referente a um convênio com o FNDE de 2013.

"Se tivesse pronta, eu colocaria minha neta ai, fica do lado de casa. Agora pago mensalidade numa particular pra ela", disse o pintor Severino Amaro dos Santos, 53, em frente à obra.

   Obra de uma creche abandonada há vários anos, na região central da cidade de Flexeiras, em Alagoas - Pedro Ladeira/Folhapress 

Além de ignorar prioridades, a liberação dos recursos federais para a compra de kits de robótica foi a jato. Em quatro casos os empenhos ocorreram em dezembro e, nos outros, entre agosto e outubro.

O dinheiro foi depositado para os municípios entre fevereiro e março —e é mais um exemplo da falta de critérios técnicos e do domínio do apadrinhamento político na definição da liberação de verbas do MEC na gestão Jair Bolsonaro (PL).

O empenho é a primeira etapa da execução orçamentária e reserva o recurso para determinada ação.

Há cidades que aguardam há mais de dois anos a liberação de recursos já empenhados: Aporá (BA), por exemplo, espera do FNDE desde fevereiro de 2020 parcela de R$ 7,9 milhões para finalizar uma obra de creche e pré-escola.

Questionados pela reportagem, MEC e FNDE não responderam, assim como as prefeituras de União dos Palmares, Canapi, Santana do Mandaú, Branquinha e Maravilha. Os secretários de Educação de Flexeiras e Barra de Santo Antonio negam irregularidades.

O presidente da Câmara, Arthur Lira, disse não ter envolvimento com contratação de empresas pelos municípios, que não solicitou aceleração de liberações e que os processos obedecem a critérios técnicos do FNDE.

Em 28 de março o ministro Milton Ribeiro foi exonerado após vir à tona a existência de um balcão de negócios na pasta, com participação de pastores evangélicos sem vínculo oficial com o poder público e acusações de cobrança de propina até em barra de ouro.

Ribeiro perdeu o cargo sete dias após a reportagem revelar áudio em que ele dizia que privilegiava um dos pastores lobistas a mando de Bolsonaro. A existência da atuação extraoficial dos pastores foi revelada pelo jornal O Estado de S. Paulo.

Há no orçamento público uma rubrica específica para compra de materiais, que incluem os kits de robótica. Os R$ 26 milhões liberados para aquisição do material aos municípios alagoanos representam 68% de tudo que foi pago neste ano pelo FNDE para todo o país.

No ano inteiro de 2021, o FNDE pagou apenas R$ 2,4 milhões para a compra de kits de robótica.

 

Ligado ao MEC, o FNDE é controlado pelo centrão —o presidente do fundo, Marcelo Lopes da Ponte, era chefe de gabinete de Ciro Nogueira (PP-PI), ministro da Casa Civil de Bolsonaro, aliado de Lira. Os dois comandam o PP, legenda que dá sustentação ao governo.

Outras cidades alagoanas, como Delmiro Gouveia e São José da Laje, também contrataram a mesma empresa mas ainda não receberam recursos do FNDE para este fim.

A empresa fornecedora dos kits de robótica para as escolas de Alagoas é a Megalic, que funciona em uma pequena casa no bairro de Jatiuca, em Maceió, com capital social de R$ 1 milhão.

Apesar de fechar contratos milionários, a empresa é intermediária, não produz kits de robótica. Os registros da Megalic indicam atuação em diversas áreas, de materiais de limpeza a instrumentos médicos.

A Megalic está em nome de Roberta Lins Costa Melo e Edmundo Catunda, pai do vereador de Maceió João Catunda (PSD). A proximidade do vereador e de seu pai com Lira é pública.

dois homes sorrindo m um cartas em que se lê: trabalhando pela educação de Alagoas  Vereador João Catunda em divulgação com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) - Reprodução

A informação da relação de Lira com os donos da empresa contratada pelas prefeituras de Alagoas foi revelada pela Agência Pública.

O vereador e o presidente da Câmara foram os responsáveis por levar integrantes do FNDE e o ex-ministro da Educação, Milton Ribeiro, a um encontro com prefeituras em Maceió em novembro passado.

O secretário de Educação de Barra de Santo Antonio, Gustavo Medeiros, disse à reportagem que esteve neste evento a convite de Catunda. O município recebeu R$ 2,4 milhões para compra de kits.

Catunda também foi levado por Lira a um encontro com o ministro Edson Fachin, do STF (Supremo Tribunal Federal) e do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), em 9 de março. Ele ainda é recebido recorrentemente na casa do presidente da Câmara.

homens de terno sentados em uma mesa Presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), com o vereador João Catunda em encontro com o ministro Edson Fachin - Reprodução/TSE 

O vereador disse à reportagem que não tem relação com os negócios do pai e negou ter tido negociações com Lira. "Não faço solicitações para robótica, ou uso do meu cargo para isso, justamente porque seria imoral", disse.

No mesmo 9 de março, estavam com Lira o vereador, o pai dele e dono da Megalic, Edmundo Catunda, o ex-prefeito de Canapi Zé Hermes e o prefeito de Limoeiro de Anadia (AL), Marlan Ferreira, entre outros políticos.

Aliado de Lira, Marlan Ferreira é também presidente da Conagreste (Consórcio Intermunicipal do Agreste Alagoano).

As cidades de União dos Palmares e Barra de Santo Antonio aderiram a uma ata de registro realizada pelo consórcio. Os outros municípios aderiram à ata realizada por Canapi. Ambas têm os mesmos moldes, com a Megalic como fornecedora, e preveem os mesmos valores para a aquisição dos robôs.

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