Nem mesmo a existência de uma punição mais severa tem conseguido frear os casos de violência contra os animais em Minas Gerais. No mês em que a Lei 14.064/2020 – apelidada de Lei Sansão, em homenagem ao pitbull que foi torturado e teve as patas traseiras decepadas – completa três anos, quase 11 animais são maltratados diariamente no estado, conforme balanço da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp).
As histórias se repetem nos mais variados pontos das cidades: animais famintos nas ruas ou confinados em espaços minúsculos. Abandonados à própria sorte, eles viram alvos fáceis de crueldade, como é o caso de 35 gatos de rua envenenados no Bairro Calafate, Região Oeste de Belo Horizonte, e da cadela Fila, morta no dia 17 de agosto, após ter sido amarrada em um carro e arrastada pelas ruas de Betim, na Região Metropolitana de Belo Horizonte.
A nova legislação, aprovada em 2020, alterou a Lei de Crimes Ambientais (9.605) e prevê de dois a cinco anos de prisão, multa e proibição de guarda para quem maltratar, ferir, abusar ou mutilar cães e gatos. Antes, a pena era detenção de até um ano. Na avaliação da advogada criminalista Maíra Garcia Dias, além de punir com mais rigor quem pratica esse tipo de crime, a mudança trouxe a segurança de que, ao denunciar os casos, o animal será resgatado e o agressor penalizado.
“Anteriormente, o suspeito permanecia impune e prosseguia com os maus-tratos”, destaca. Ela ressalta o papel do estado e município na criação de mecanismos de vigilância e políticas públicas de abrigo, cuidado e adoção, que viabilizem o cumprimento da lei. “É necessário que exista atuação do poder público no combate aos maus-tratos”, sinaliza.
Vista como um avanço importante na luta pelo bem-estar animal, na prática, a Lei Sansão ainda não trouxe reflexos significativos na diminuição de ocorrências de maus-tratos, conforme apontam especialistas e protetores de animais ouvidos pelo Estado de Minas. “A lei tem seu mérito, mas, se não for trabalhada de forma integrada, ela não se sustenta e não muda a realidade. Está banalizada. Não vemos muito resultado desta lei”, afirma Adriana Araújo, coordenadora do Movimento Mineiro pelos Direitos Animais.
A afirmação de Adriana tem embasamento estatístico: de janeiro a junho, registros de maus-tratos saltaram de 1.855 para 1.911, na comparação com o mesmo período de 2022, de acordo com dados da Sejusp. Por dia, o estado tem uma média de 10,6 ocorrências do tipo. Desde a criação da lei, em 2020, até hoje, os índices seguem estáveis: sem quedas ou crescimento expressivos.
O crime de maus-tratos vai desde abandono até manter o animal preso ou negar alimentação. Os animais de rua existem em maior número, mas são comuns casos de bichinhos abandonados por seus tutores dentro das próprias casas. “O abandono é o extremo, mas a falta de água e alimentação também são uma realidade, assim como a privação de cuidados veterinários e agressões físicas. Deixar o animal no sol, no frio, na chuva, sem abrigo”, aponta a coordenadora do Movimento Mineiro pelos Direitos Animais.
Segundo ela, a pandemia de COVID-19 fez disparar o abandono de cães e gatos. “Fecharam as castrações, os mutirões e os eventos de ação. Muita gente abandonando os animais. Nunca vi na minha vida tanta violência. Até hoje não retomamos o ritmo para podermos encaminhar os animais resgatados. A proteção animal está em colapso devido à quantidade de animais abandonados”, alerta.
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