Após ser baleada na cabeça pelo ex-namorado e ficar quase dois meses internada, a fisioterapeuta Ana Clara Pereira Dias, de 31 anos, passa os dias no apartamento da prima, em BH, sem conseguir interagir com a família. A medida protetiva que ela tinha contra o suspeito e a tornozeleira eletrônica que ele usava não foram suficientes para livrar Ana da tentativa de feminicídio.
O número de autores monitorados pelo sistema aumentou 10% em Minas, no período de um ano. Passou de 595 em 2019, para 657 no ano passado. Neste ano, 396 agressores são acompanhados. Os dados são da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp).
"Minha irmã tinha uma medida devido a um cárcere privado. Toda vez que ele se aproximava, chegava uma mensagem. No dia do crime, ele camuflou o equipamento com papel alumínio”, contou Kercia Pereira Dias. Ana foi baleada no dia 26 de novembro, enquanto trabalhava em uma clínica, no Barro Preto, na região Centro-Sul de BH.
A juíza Bárbara Lívio explicou que, além da medida, é preciso insistir na denúncia. “O cumprimento da medida não é apenas uma questão do Judiciário ou das polícias. Se algum vizinho escutar algum grito, ver um homem rondando uma mulher e sabe que ela tem medida protetiva, é preciso denunciar”, alertou a magistrada.
Menos denúncia?
Nos primeiros três meses deste ano, o número de casos registrados de violência doméstica foi de 35.372 em Minas, segundo a Polícia Civil. No mesmo período de 2020, foram 37.213 situações – decréscimo de 5%.
“A queda pode estar ligada à questão da pandemia. As mulheres têm menos acesso aos meios para denunciar. A queda não significa, necessariamente, diminuição dos casos Ela pode caracterizar o aumento da cifra oculta (quando não se faz a denúncia)”, enfatizou a juíza Bárbara Lívio.
Perguntas podem salvar vidas
Desde o início de maio, o policial que registra uma violência doméstica em Minas Gerais preenche o Formulário Nacional de Avaliação de Risco. O questionário tem cinco etapas e detalha o tipo de violência, o perfil do agressor, as características da família, etc.
"Essa sinalização pode agilizar algumas intervenções rápidas e necessárias para que essa violência não evolua para casos mais graves, como uma medida protetiva, um pedido de prisão", explicou a subsecretária de Prevenção à Criminalidade de Minas, Andreza Gomes. Sobre a tornozeleira, o TJMG disse que o pedido geralmente é feito pela promotoria.
Família questiona sistema de proteção
A família de Ana Clara defende que é necessário que haja mudanças no sistema de proteção para evitar que mais mulheres sejam vítimas. Segundo Kercia, o crime aconteceu por volta das 13 h, e a mensagem de aproximação do suspeito só foi recebida por volta das 15h.
“O sistema tem que mudar a forma de proteção. Minha irmã tinha medida protetiva e aconteceu o que aconteceu. É a segunda vez que, na minha família, ocorre essa violência. Em 1996, a minha mãe foi vítima de feminicídio pelo meu pai”, desabafou. A Sejusp informou que “a tornozeleira eletrônica não tem o papel de impedir o cometimento de um novo crime. Ela é um rastreador e, em caso de cometimento de práticas ilícitas, pode auxiliar na investigação e elucidação dos fatos”.
Perda de sinal
A Sejusp informou que, no dia do crime, a demora no recebimento do alerta por Ana ocorreu por causa de um problema no sinal. “A vítima utilizava o aparelho de rastreamento e, por duas vezes, nos dias 3 e 5 de novembro, ela foi alertada sobre a aproximação do agressor. Nestas datas, o monitorado também recebeu o alerta da unidade para que se afastasse do perímetro onde estava a vítima. No dia do crime, a perda do sinal se deu às 12 h e o sinal voltou a ser emitido às 15 h”.
Ajude Ana
A família de Ana fez uma vaquinha para construir um quarto adaptado para a fisioterapeuta. Agora, ela precisa de ajuda para manter o tratamento. Quem quiser, pode ajudar pelo Pix 07486191601 ou ligar para o (31) 9 9695-5711