Fortuna de Minas, a 100 quilômetros de Belo Horizonte, é uma cidade linda, bem pequena. Tem menos de três mil habitantes. Todo o mundo se conhece e sabe das alegrias, tristezas e até das inquietações do outro.
Um dia, um de seus moradores olhou para o céu, para as árvores, e percebeu que estavam vazios. Ficou em silêncio, mas não ouviu o canto dos pássaros que gostava de escutar desde pequeno. Os trinca-ferros, papa-capina e canários da terra não voavam mais por Fortuna de Minas.
Eles haviam sido caçados ou aprisionados em gaiolas. O gerente de agência Washington Moreira Filho não se conformou. Queria, de novo, ouvir o canto dos pássaros e começou a abrir as gaiolas. “O meu sonho inicial era ver essa praça cheia de canários e Fortuna cheia de canários”, relata.
Há quatro anos, Washington Moreira Filho resolveu que já era hora de realizar seu sonho. Começou, então, uma campanha para convencer os moradores de Fortuna de Minas a abrir as gaiolas. “Não foi tão difícil assim convencer o pessoal na época, porque parece que todos já tinham essa ideia, mas é aquela coisa, você ter um pássaro preso em casa e você gostaria muito de vê-lo livre. Deu-se a entender que todos tinham a mesma ideia, porque foi um casamento perfeito”, explica o gerente.
A polícia passou a fiscalizar, e até as crianças entraram na campanha. “Um dia, achei um filhote de passarinho machucado. Aí, botei ele na árvore para a mãe pegar ele”, conta a estudante Maria Eduarda.
A cada mês, a cada semana, um morador se juntava a Washington e abria as gaiolas, como o carpinteiro José de Morais, conhecido como Seu Zé, de 85 anos, que chegou a ter 18 passarinhos presos.
A oficina de marcenaria do Seu Zé funciona há 40 anos em Fortuna de Minas. E tudo permanece praticamente igual. Ou melhor, quase tudo. O Seu Zé, por exemplo, não fabrica mais esses alçapões que eram usados para capturar as aves silvestres, aves que saiam da cidade para dentro das gaiolas.
Até que, um dia, o Seu Zé resolveu libertar as aves presas que estavam dentro da oficina. “Ninguém quer ficar preso. O canto é bonito. Estou orgulhoso de ter uma vida desse jeito, e eles também,. Os passarinhos também querem viver tranquilos”, relata.
Só não foram liberados os pássaros que já nasceram em cativeiro. E basta uma caminhada por Fortuna de Minas para perceber que, depois de quatro anos, a campanha de Washington deu frutos, ou melhor, penas.
Os passarinhos estão por toda parte. Os mais numerosos são os canários da terra, ou canários chapinha, que tinham desaparecido. Os machos são mais amarelinhos que as fêmeas. Agora, eles já se misturam a outros pássaros comuns na região, como o joão-de-barro , pica-pau. beija-flor.
E não é que a cidade, além do canto dos pássaros, ganhou outra alternativa de renda com o comércio de casas pré-fabricadas para passarinho. Um grupo de artesãos passou a construir ninhos para vender. São iguais aos do joão-de-barro. Os canarinhos adoram se hospedar neles.
A artesã Elizabeth Ribeiro conta como aprendeu a construir a casinha de joão-de-barro. “Eu fico feliz, que eu sei que eu estou ajudando a natureza. E isso é muito importante para época que nós estamos vivendo”, explica.
O pedreiro Wanderley da Silva já comprou três ninhos. Ele também já teve passarinhos presos. Agora, prefere vê-los cantando no terraço, livres para ficar o tempo que quiserem. “É morador, já rodou os três ninhos aqui já. Ele já chocou nas três casas, já três vezes, já foram três remessas de filhotes”, revela. Para ele, passarinho preso nunca mais. “Espero, com certeza, que outras cidades possam aderir a esse projeto e levar isso adiante porque o futuro está nisso daí, a natureza precisa da gente”, conclui.
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