O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) quer criar 521 cargos com salários de até R$ 23 mil sem a necessidade de concurso público, ou seja, com as indicações a serem feitas por integrantes da corte.
Uma minuta de ato normativo contendo projeto de lei que cria os cargos, já aprovada pela Comissão de Organização e Divisão Judiciárias do tribunal, prevê ainda outros 104 postos que poderão ser ocupados somente por servidores efetivos.
O impacto total, juntando os 625 postos, é de R$ 156,1 milhões em 2024 e R$ 161 milhões em 2025, conforme contas da corte. O projeto agora precisa ser enviado e aprovado pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). O texto ainda não chegou à Casa.
O TJMG justifica a criação dos cargos afirmando haver necessidade de gestão de processos. “A estrutura dos gabinetes de magistrados no Judiciário de Minas Gerais é composta por tais cargos, fundamentais à gestão de acervos enormes de processos, de modo que a criação dos referidos cargos é premissa à instalação de novas unidades judiciárias no estado”, diz a corte, em nota.
O tribunal tem 1.795 cargos de indicação pessoal, conforme números de setembro de 2023. Os 521 possíveis novos contratados, portanto, representam elevação de 29,02% no número de cargos para livre indicação dos integrantes da corte.
As despesas do tribunal com cargos sem a realização de concurso atingiram R$ 249 milhões em 2022, saindo de R$ 48,2 milhões no primeiro trimestre para R$ 64,2 entre abril, maio e junho, R$ 68,2 milhões de julho a setembro, e 68,4 milhões nos últimos três meses daquele ano.
Nos primeiros três meses de 2023 houve uma queda, para R$ 53,4 milhões. Nos três meses seguintes, porém, a conta quase dobrou, indo a R$ 101,1 milhões. Entre julho, agosto e setembro, o último dado disponibilizado pela corte, o valor pago aos apadrinhados foi de R$ 92,8 milhões.
Os valores oscilam de acordo com benefícios recebidos pelos servidores. No mês passado, por exemplo, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) abriu investigação para apurar a realização de plantões por servidores e magistrados do Poder Judiciário de Minas Gerais, com pagamento de R$ 29,1 milhões desde junho de 2021.
Até setembro de 2023, o gasto da corte com pessoal (integrantes do Poder Judiciário, servidores concursados e por indicação) somou R$ 3 bilhões. Em todo o ano passado, esse montante foi de R$ 3,7 bilhões.
Os cargos a serem criados são, por exemplo, para assessor de juiz, assistente de juiz e assistente judiciário. Os salários variam de R$ 5.552,50 a 23.680,84.
A assessoria de comunicação do TJMG disse que a diferença “entre os cargos de assessores, assistentes de juiz e de assistente judiciário decorrem das atribuições de cada uma das funções, previstas nas respectivas legislações mineiras”.
Na justificativa do projeto de lei, incluída na minuta, o presidente do TJMG , José Arthur de Carvalho Pereira Filho, também fala que o aumento no número de cargos é por conta do crescimento de processos judiciais. “Não se pode olvidar que o cenário atual em que se encontra o Poder Judiciário nacional é preocupante, diante do crescimento progressivo de demandas postas à sua apreciação”, disse.
O TJMG contava com a criação dos cargos ainda neste ano. A minuta aprovada pela comissão já projetava gastos com os novos postos para 2023, de R$ 41,7 milhões. A minuta foi aprovada em votação eletrônica da instância ocorrida entre 27 e 31 de outubro. (Leonardo Augusto)
Rio de Janeiro – Insatisfação com um salário médio de R$ 28 mil, episódios de abuso de autoridade e acúmulo de penduricalhos ajudam a explicar por que especialistas afirmam que muitos juízes não se consideram servidores, mas uma classe à parte no setor público.
No Judiciário federal, por exemplo, magistrados ganham, em média, até sete vezes mais do que os demais funcionários. A remuneração dos servidores vai de R$ 4.124, salário inicial de auxiliares jurídicos, a R$ 19,8 mil, valor mais alto para analistas.
Já entre os juízes, a média salarial é de R$ 28 mil, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de setembro.
Mesmo recebendo valores maiores, magistrados estão mais insatisfeitos com a remuneração. Para aproximadamente 74%, o salário que recebem não condiz com o trabalho. Entre os servidores, a taxa é de 46%.
Os dados são do censo do CNJ divulgado neste ano. As respostas foram coletadas por formulário eletrônico. Participaram 63,2 mil servidores e 6.100 magistrados.
Em nota, a Associação dos Magistrados Brasileiros diz que a categoria enfrenta desvalorização e, por isso, mais juízes deixam a carreira em busca de melhores condições no mercado privado.
Segundo a entidade, a falta de correção dos subsídios afeta a qualidade de vida dos magistrados e o acesso à Justiça só vai ser garantido com investimentos na prestação jurisdicional.
“Juízes não se veem como servidores, mas como uma categoria especial que enseja prerrogativas próprias, para além daquelas dos funcionários públicos”, afirma Vitor Rhein Schirato, professor da Faculdade de Direito da USP.
Diferentemente dos outros servidores, magistrados têm direito a duas férias por ano. Muitos também recebem valores consideráveis em benefícios, incluindo auxílios-moradia e adicionais por acúmulo de função, que são acrescidos à remuneração. Em setembro, 226 juízes federais receberam acima do teto constitucional (R$ 41.650,92).
Mesmo a perda de cargo e penalidades é diferente entre magistrados e servidores. Isso porque profissionais públicos e membros de Poder, como juízes e promotores, são regidos por artigos distintos da Constituição, segundo Wallace Corbo, professor de direito constitucional da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerf) e da Fundação Getulio Vargas (FGV).
A estabilidade, por exemplo, é dada a servidores após três anos de estágio probatório. Para magistrados, é dada a vitaliciedade depois de dois anos.
Por essa diferença, um juiz ou um desembargador só deixa o cargo por ação judicial, enquanto o servidor pode ser exonerado por processo administrativo interno. No geral, a penalidade máxima dada aos magistrados é a aposentadoria compulsória, em que eles continuam recebendo salário.
“Isso explica por que magistrados, muitas vezes, não se veem como servidores, e sim como membros de poder que de fato tem um tratamento diferenciado na Constituição, mas que não justifica a visão elitista”, afirma Corbo.
Vitor Rhein Schirato, da USP, atribui essa percepção ao fato de a magistratura ser historicamente ocupada por classes mais altas, o que tornou a carreira elitizada.
O censo do CNJ não apresenta informações sobre a renda da família de origem dos juízes, mas mostra que em torno de 45% têm pai e mãe com ensino superior completo. Entre os outros funcionários do Judiciário, a mesma taxa cai para aproximadamente 29%.
Além disso, a magistratura é pouco diversa, composta principalmente por homens (60%) e brancos (82%), o que a torna ainda mais elitizada. Apenas 15% dos juízes são negros. Entre os outros servidores do Judiciário, a cifra de pretos e pardos sobe para 26,5%. Mulheres são maioria, cerca de 54%.
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