A delação premiada acordada entre o empresário Marcos Valério e a Polícia Federal, à qual a reportagem de teve acesso, pode complicar ainda mais a situação da empreiteira Andrade Gutierrez e de alguns de seus antigos dirigentes, já implicados na Lava Jato. O documento, que aguarda homologação do Supremo Tribunal Federal (STF), indica que a empreiteira participou de outras ações criminosas em Minas Gerais e durante o mensalão petista.
Em pelo menos três anexos apresentados por Valério, o empresário cita o envolvimento da Andrade Gutierrez em casos distintos. No de número 19, o operador do mensalão afirma que o então candidato a prefeito de Contagem Ademir Lucas teria o procurado pedindo doações e recursos em caixa dois para sua campanha. Valério, então, procurou o Banco Rural para realizar um empréstimo no valor de R$ 6 milhões para o comitê de Ademir. Em troca, teria, segundo Valério, ficado acordado que a Prefeitura de Contagem, quando Ademir Lucas viesse a ser eleito, iria pagar dívidas da Andrade com o Rural e favorecer a empreiteira na licitação para a coleta de lixo da cidade.
Com a vitória de Ademir em 2000, a coleta passou a ser realizada pela empresa Construtora e Dragagem Paraopeba, que, segundo a delação, repassaria um percentual do contrato à Andrade Gutierrez posteriormente.
Já no anexo 25, Valério conta que a Andrade Gutierrez realizava obras para o governo de Minas e que parte dos recursos que seriam destinados a essas obras eram repassados, por meio de empréstimos fraudulentos no Banco Rural, para a agência SMPB, de propriedade do empresário. Depois, a agência transferia o dinheiro para campanhas eleitorais. O anexo, um resumo da delação, não indica o ano em que esse esquema teria funcionado. Só os depoimentos de Valério poderão esclarecer a época e quem era o governador de Minas Gerais no período das supostas irregularidades.
A relação da Andrade Gutierrez com o PT também foi contemplada na delação. Conforme já mostrou, segundo o delator, Paulo Okamotto – hoje presidente do Instituto Lula e na época comandante do Sebrae – teria acertado com o então vice-presidente do grupo Andrade Gutierrez, Roberto Gutierrez, falecido em 2006, um repasse de R$ 5 milhões da empreiteira para pagar advogados de réus do mensalão.
Valério diz que o recurso foi transferido de uma conta no exterior por meio de um banco do Panamá. “Depois, ficou acertado que teríamos que pegar o repasse com um doleiro de São Paulo”, diz trecho da delação. Segundo o texto, este foi o primeiro pagamento à defesa dos seis réus do núcleo publicitário do esquema e buscava proteger o governo petista.
Em nota, a Andrade Gutierrez disse colaborar com as investigações por meio do acordo de leniência firmado com o Ministério Público Federal (MPF). A empresa afirma que segue com seu “compromisso público de esclarecer e corrigir todos os fatos irregulares ocorridos no passado”.
Por telefone, o ex-prefeito de Contagem Ademir Lucas negou as acusações presentes na delação. “Não é verdade, nunca recebi R$ 1 de quem quer que seja, a não ser dentro dos preceitos legais da época”.
Se a delação de Valério for aceita e os crimes revelados não tiverem sido relatados nos acordos de ex-dirigentes da Andrade, como Flavio Barra, da AG Energia, e Otávio Marques Azevedo, ex-presidente do grupo, eles podem ter seus benefícios revistos, o que pode levá-los de volta à prisão. Por corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa, Otávio já foi condenado a 18 anos de detenção e, Flavio, a 15 anos.
Citado na delação de Valério como recebedor de repasses ilegais por meio de contratos de publicidade com a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), o ex-ministro Anderson Adauto, que ocupou a presidência da Casa entre 1999 e 2001, negou as acusações.“Fui presidente da ALMG em 1999. Na época não tinha agência de publicidade cuidando da Casa, a primeira licitação sobre essa área foi feita em 2001 e finalizada em 2002, em outra presidência. Não sei de nada a respeito deste assunto”, disse Adauto.
No texto da delação, Valério relata ter feito repasses, a pedido de um assessor do ex-ministro, para uma conta em nome de Anderson Adauto. O empresário também alegou ter, durante todo o tempo da presidência de Adauto na ALMG (de 1999 a 2001), ter destinado recursos para compra e reforma de um apartamento do ex-ministro em Belo Horizonte. “Os recursos foram entregues em dinheiro vivo para pagar as despesas de mão de obra do apartamento, além do material de construção”, completa.
Agostinho Patrus Filho. Em nota enviada à Redação, a assessoria de imprensa do deputado Agostinho Patrus Filho (PV) esclareceu que a reportagem de publicada na edição de ontem citou o nome do parlamentar erroneamente.
Explicação. “Agostinho Patrus Filho iniciou sua trajetória pública em 2007, na Assembleia Legislativa, quase dez anos depois, portanto, dos fatos apresentados pela matéria em questão”, destaca a nota enviada ao jornal.
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