"Quando falo que tive câncer no coração, as pessoas riem, porque acham que estou mentindo. Eu também achava que isso não existia, mas, queira ou não, existe e sou a prova viva disso”, diz a coordenadora comercial Viviane Ramos, 41. No final da última semana, ela recebeu alta após uma cirurgia para tratar um problema raro: um tumor maligno no coração. Eles são menos de 1% dos casos cancerígenos e, por isso, os diagnósticos sequer são contabilizados pelo Instituto Nacional do Câncer (Inca).
Hoje, Dia Mundial do Câncer, ela se recupera do procedimento raríssimo em casa, com ajuda da filha, de 20 anos. Um dos médicos responsáveis pela operação, em Belo Horizonte, é o cirurgião cardiovascular Charles Simão. Ele conta que há mais de 20 anos havia se deparado com um único outro caso na sua carreira envolvendo um câncer no órgão.
“O coração é muito irrigado e dinâmico. Então, a implantação de tumores é incomum. Os tumores benignos, nas válvulas do órgão, acontecem com certa frequência, mas, ainda assim, são menos de 1% das cirurgias cardíacas. Já os malignos acontecem em menos de 0,1% das vezes”, ilustra.
Cânceres são causados pela divisão irregular das células do corpo. No coração, essa divisão se concentra no início da vida – depois, como em outros músculos, o crescimento deve-se ao aumento de tamanho das células já existentes.
Tumores benignos (os mais frequentes no coração, mas, ainda assim, raros) não são câncer. Eles se manifestam na forma de mixomas, por exemplo, massas que surgem, especialmente, no átrio esquerdo do órgão. Mesmo que não sejam malignos, podem levar a disfunções.
Sintomas. Segundo Simões, a presença de um tumor é uma das últimas coisas que passam pela cabeça de um cardiologista ao receber uma paciente com fraqueza e pressão baixa. Cogitar um tumor maligno é ainda mais impensável – mas aconteceu com Viviane.
“Às vezes, eu estava sentada no sofá e o coração disparava em um ritmo estranho. Eu tinha falta de ar e sensação de desmaio. O cansaço foi me debilitando de fazer coisas como varrer a casa”, detalha.
Por si só, o câncer no coração não causa sintomas e pode passar despercebido. O que atinge o paciente é o comprometimento de funções cardíacas pela localização do tumor. As veias pulmonares de Viviane estavam sendo obstruídas por ele, alojado no átrio esquerdo do órgão, daí a sensação de cansaço.
Detecção. Os médicos souberam que era um tumor após ela ter uma embolia pulmonar, em outubro de 2019, e parar no hospital. “O tumor é muito visível em exames rotineiros, como tomografia e ecocardiograma (tipo de ultrassom)”, especifica Simão.
A dificuldade do diagnóstico deve-se à raridade dos casos, pois os médicos não costumam investigar o problema imediatamente – pacientes com sopro, arritmia ou insuficiência cardíaca devem ser avaliados com mais cuidado.
Tratamento. “Fiquei muito triste quando soube do diagnóstico, porque preciso ver minha filha formada e pensei em todos os meus sonhos. O coração é um órgão vital, não vivo sem ele. Então, como faria se não tivesse cura?”, lembra Viviane.
Em alguns casos de tumor maligno primário, realmente, não há solução – quando ele se alojou em grande parte da parede do órgão, por exemplo. Nas situações em que a remoção é possível, a cirurgia é em grande escala: abre-se o tórax do paciente e o coração fica funcionando com ajuda de uma máquina, enquanto o médico faz uma “raspagem” do tumor com material cirúrgico.
Nos casos de câncer metastático, pode haver quimioterapia. “Os médicos me disseram que só não posso desistir de viver. E é isso o que eu quero: viver”, finaliza Viviane.
Os tipos de tumor no coração: a maior parte dos casos é de tumores benignos, removidos cirurgicamente.
Tumores benignos:
Tumores malignos:
Tumores primários: surgem no tecido do próprio coração. Em geral, são benignos.
Tumores secundários: também são chamados de metastáticos, pois derivam da metástase - disseminação do tumor em outras partes do corpo. São sempre malignos.
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